A mãe disse que carregar água na peneira
A mãe disse que era o mesmo que
catar espinhos na água
O mesmo que criar peixes no bolso.
O menino era ligado em despropósitos.
Quis montar os alicerces de uma casa sobre orvalhos.
A mãe reparou que o menino
gostava mais do vazio
do que do cheio.
Falava que os vazios são maiores
e até infinitos.
Com o tempo aquele menino
que era cismado e esquisito
porque gostava de carregar água na peneira
(...) O menino aprendeu a usar as palavras.
Viu que podia fazer peraltagens com as palavras.
E começou a fazer peraltagens.
Foi capaz de modificar a tarde botando uma chuva nela.
O menino fazia prodígios.
Até fez uma pedra dar flor!
A mãe reparava o menino com ternura.
A mãe falou:
Meu filho você vai ser poeta.
Você vai encher os
vazios com as suas peraltagens
e algumas pessoas
vão te amar por seus despropósitos.
(...) A mãe só que falou que eu iria viver leso fazendo só essas coisas.
O pai completou: ele precisava de ver outras coisas além de ficar ouvindo só o canto dos pássaros.
E a mãe disse mais: esse menino vai passar a vida enfiando água no espeto!
Foi quase.
(Manoel de Barros)
Fatima Vieira - Psicóloga Clínica
3 comentários:
fazer poesia é um dom maravilhoso de ver a vida com todos os seus sentidos e abrangências.Maravilhoso
poema.Um abraço
fazer poesia é um dom maravilhoso de ver a vida com todos os seus sentidos e abrangências.Maravilhoso
poema.Um abraço
Guaraciaba Perides,
agradeço sua visita e gentil comentário, um abraço!
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