domingo, 18 de dezembro de 2011

... essa vaga doçura fez o meu coração doer de saudade!

Retirou delicadamente o vestido e pendurou no varal da eternidade...

Ela procurou um vestido... um vestido para aquele momento, e tinha que ter um corte e ajuste perfeito... segunda pele que abrigaria sua alma.
 (...)  cobrir a paisagem da "carne afetada pela escrita e convidada ao devaneio" (Barthes).
 Cortar o tecido na trama, para fazer emergir o feminino e a possibilidade de novas linhas era se deparar com aquilo que estava escrito e com a escritura do porvir. 
Era também aquilo que Blanchot dizia bem: '' ... fazemos poesia somente no puro lampejo do corte..." O corte era radical - era corte em si.
 Enquanto procurava o vestido para ocasião tão especial ela lembrou Clarice assustada com essa coisa sobrenatural que é viver: "O que faço dessa felicidade ao meu redor que é eterna e que passará daqui a um instante, porque o corpo só nos ensina a ser morte?" (Flor de Bela Alma/ Fatima Vieira)  

                                              

meu vestido, ficou meu cheiro nele, meu sonho...


domingo, 4 de dezembro de 2011

Ψ E todos nós somos meio dementes! (Gilles Deleuze)

"O verdadeiro charme das pessoas reside em quando elas perdem as estribeiras, quando não sabem muito bem em que ponto estão. Não são pessoas que desmoronam, pelo contrário, nunca desmoronam. Mas se não captar a pequena marca de loucura de alguém, não pode gostar desse alguém. É exatamente este lado que interessa. E todos nós somos meio dementes. Se não captar o ponto de demência da pessoa, eu temo que... aliás, fico feliz em constatar que o ponto de demência de alguém seja a fonte do seu charme. Portanto, vamos ao G! "(*G significa gauche, esquerda em francês).
 "Jamais interprete, experimente…” 
 "São organismos que morrem, não a vida."

"A arte é o que resiste: ela resiste à morte, à servidão, à infâmia, à vergonha... A arte é o destino inconsciente do artista."

"Os pontos fracos de um livro são com frequência a contrapartida de intenções vazias que não se soube realizar."

“Nossa vida moderna é tal que, quando nos encontramos diante das repetições mais mecânicas, mais estereotipadas, fora de nós e em nós, não cessamos de extrair delas pequenas diferenças, variantes e modificações.”

“O eterno retorno diz: o que quiseres, queira-o de tal maneira que também queiras seu eterno retorno.”

“Os conceitos com compreensão finita são os conceitos nominais: os conceitos com compreensão indefinida, mas sem memória, são os conceitos da Natureza.”

“[...] repete-se tanto mais o passado quanto menos ele é recordado..."

“Nada aprendemos com aquele que nos diz: faça como eu. Nossos únicos mestres são aqueles que nos dizem “faça comigo” e que, em vez de nos propor gestos a serem reproduzidos, sabem emitir signos a serem desenvolvidos no heterogêneo.”

“A roda do eterno retorno é, ao mesmo tempo, produção da repetição a partir da diferença e seleção da diferença a partir da repetição.”

“[...] Deus não criou Adão pecador, mas, primeiramente, o mundo em que Adão pecou.”

“O paradoxo da repetição não estará no fato de que não se pode falar em repetição a não ser pela diferença ou mudança que ela introduz no espírito que a contempla?


“Sob o eu que age há pequenos eus que contemplam e que tornam possíveis a ação e o sujeito ativo.”

“Só o presente existe.”

“O fundamento do tempo é a Memória.”

“O passado não é o antigo presente, mas o elemento no qual este é visado.”

“Cada um escolhe sua altura ou seu tom, talvez suas palavras, mas a melodia é a mesma e há um mesmo trá-lá-lá sob todas as palavras, em todos os tons possíveis e em todas as alturas.”

“Eis que o presente e o passado, nesta última síntese do tempo, são apenas dimensões do futuro: o passado, como condição, e o presente como agente.”

“[...] atrás das máscaras há ainda máscaras, e o mais oculto é ainda um esconderijo e assim indefinidamente. Desmascarar alguma coisa ou alguém é uma ilusão.”

“[...] o inconsciente deseja e só faz desejar.”

“Não é o que eles dizem ou o que eles pensam, mas sua vida é que é exemplar e os ultrapassa.”

“Nenhuma decisão é final, todas se ramificam.”

“O catecismo, tão inspirado nos Padres platônicos, nos familiarizou com a ideia de uma imagem sem semelhança: o homem foi feito à imagem e semelhança de Deus, mas, pelo pecado, perdemos a semelhança, guardando a imagem…”

“[...] há alguém, mesmo que seja apenas um, com a modéstia necessária, que não chega a saber o que todo mundo sabe e que nega modestamente o que presume que todo mundo reconhece.”

“[...] o pensamento conceitual filosófico tem como pressuposto implícito uma Imagem do pensamento, pré-filosófica e natural, tirada do elemento puro do senso comum.”

“Não contemos com o pensamento para fundar a necessidade relativa do que ele pensa; contemos, ao contrário, com a contingência de um encontro com aquilo que força a pensar, a fim de erguer e estabelecer a necessidade absoluta de um ato de pensar, de uma paixão de pensar. As condições de uma verdadeira crítica e de uma verdadeira criação são as mesmas: destruição da imagem de um pensamento que pressupõe a si próprio, gênese do ato de pensar no próprio pensamento.”

“Alguém nunca é superior ou exterior àquilo de que ele se aproveita: o tirano institucionaliza a besteira, mas é o primeiro serviçal de seu sistema, e o primeiro instituído é sempre um escravo que comanda escravos.”

“[...] o sentido só funda a verdade tornando o erro possível. Uma proposição falsa, portanto, não deixa de continuar sendo uma proposição dotada de sentido. Quanto ao não-sentido, ele seria o caráter daquilo que não pode ser nem verdadeiro nem digital.”

“Aprender é tão-somente o intermediário entre não-saber e saber, a passagem viva de um ao outro. Pode-se dizer que aprender, afinal de contas, é uma tarefa infinita ..." 


“Rigorosamente, não há problemas sociais que não sejam econômicos, se bem que suas soluções sejam jurídicas, políticas, ideológicas, e que os problemas se exprimam também nesses campos de resolubilidade.”

“O problema do pensamento não está ligado à essência, mas à avaliação do que tem importância e do que não tem ..." 


“[...] a revolução é a potência social da diferença, o paradoxo de uma sociedade, a cólera da própria Ideia social.”

“O mundo é um ovo, mas ovo é, ele próprio, um teatro: teatro de encenação, onde os papéis levam vantagem sobre os atores, os espaços sobre os papéis, as Ideias sobre os espaços.”

“[...] um conceito é totalmente incapaz de especificar-se ou dividir-se; o que age sob ele, como arte oculta, como agente de diferenciação, são os dinamismos espaço-temporais.”

“[...] não somos fixados a um estado ou a um momento, mas sempre fixados por uma Ideia como pelo brilho de um olhar..." 


“[...] é verdade que Deus faz o mundo calculando, mas seus cálculos nunca estão corretos, e é mesmo esta injustiça no resultado, esta irredutível desigualdade, que forma a condição do mundo.”“Não há amor que não comece pela revelação de um mundo possível como tal, enrolado em outrem que o exprime.”

“A teoria do pensamento é como a pintura: tem necessidade dessa revolução que faz com ela passe da representação à arte abstrata; é este o objeto de uma teoria do pensamento sem imagem.”

“É provável que as noções de singular e de regular, de notável e de ordinário tenham, para a própria filosofia, uma importância ontológica e epistemológica muito maior que as de verdadeiro e de falso, relativas à representação, pois o que se chama sentido depende da distinção e da distribuição desses pontos brilhantes na estrutura da Ideia.”

“Isso porque não há outro problema estético a não ser o da inserção da arte na vida cotidiana. Quanto mais nossa vida cotidiana aparece estandardizada, estereotipada, submetida a uma reprodução acelerada de objetos de consumo, mais deve a arte ligar-se a ela e dela arrancar esta pequena diferença que, por outro lado e simultaneamente, atua entre outros níveis de repetição, como também fazer os dois extremos das séries habituais de consumo ressoarem com as séries dos instintos de destruição e de morte; juntando, assim, o quadro da crueldade ao da besteira, descobrindo sob o consumo um crispar de maxilares hebefrênico e, sob as mais ignóbeis destruições da guerra, ainda processos de consumo, reproduzir esteticamente as ilusões e mistificações que constituem a essência real desta civilização, para que, finalmente, a Diferença se expresse com uma força repetitiva de cólera, capaz de introduzir a mais estranha seleção, mesmo que seja uma contração aqui e ali, isto é, liberdade para um fim de mundo. Cada arte tem suas técnicas de repetições imbricadas, cujo poder crítico e revolucionário pode atingir o mais elevado ponto para nos conduzir das mornas repetições do hábito às profundas repetições da memória e, depois, às repetições últimas da morte, onde se decide nossa liberdade.” 

Gilles Deleuze (1925-1995), filósofo francês que participou ativamente do movimento de 68 na França.
 É considerado um dos maiores nomes do movimento que ficou conhecido na filosofia e ciências sociais como pós-estruturalismo, ao lado de pensadores como Michel Foucault, Jaques Derrida, Felix Guattari, entre outros. 
O livro “Conversações” é uma compilação de várias entrevistas que Deleuze deu ao longo de sua vida.
 Ψ Fatima Vieira - Psicóloga Clínica

... é possível ser sábio sem arrogância e sem provocar hostilidades!






Lucius Aneu Sêneca
* Córdoba, Espanha c. 4 a.C
+ Roma, Itália – 65 d.C -
(Séneca, in 'Cartas a Lucílio')"O Perigo nas Relações Humanas"
Nas relações humanas o perigo é coisa de todos os dias. Deves precaver-te bem contra este perigo, deves estar sempre de olhos bem abertos: não há nenhum outro tão frequente, tão constante, tão enganador! A tempestade ameaça antes de rebentar, os edifícios estalam antes de cair por terra, o fumo anuncia o incêndio próximo: o mal causado pelo homem é súbito e disfarça-se com tanto mais cuidado quanto mais próximo está. Fazes mal em confiar na aparência das pessoas que se te dirigem: têm rosto humano, mas instintos de feras. Só que nestas apenas o ataque directo é perigoso; se nos passam adiante não voltam atrás à nossa procura. Aliás, somente a necessidade as instiga a fazer mal; a fome ou o medo é que as forçam a lutar. O homem, esse, destrói o seu semelhante por prazer. Tu, contudo, pensando embora nos perigos que te podem vir do homem, pensa também nos teus deveres enquanto homem. Evita, por um lado, que te façam mal, evita, por outro, que faças tu mal a alguém. Alegra-te com a satisfação dos outros, comove-te com os seus dissabores, nunca te esqueças dos serviços que deves prestar, nem dos perigos a evitar. Que ganharás tu vivendo segundo esta norma? Se não evitas que te façam mal, pelo menos consegues que te não tomem por tolo. Acima de tudo, porém, refugia-te na filosofia: ela te protegerá no seu seio, neste templo sagrado viverás seguro ou, pelo menos, mais seguro. Não dão encontrões uns nos outros senão os que caminham pela mesma estrada. Não deverás, todavia, fazer alarde da tua filosofia; muitos dos seus adeptos viram-se em situações perigosas por a praticarem com excessiva altivez e obstinação. Usa-a tu para te livrares dos teus vícios, não para exprobares os dos outros. Que ela te não leve a viver ao invés de todos os demais, nem a parecer condenar tudo aquilo que não praticas. É possível ser sábio sem arrogância e sem provocar hostilidades.

sábado, 26 de novembro de 2011

Florianópolis te abraça Cruz e Souza!

VIDA OBSCURA
Ninguém sentiu o teu espasmo obscuro.
Ó ser humilde entre os humildes seres,
Embriagado, tonto dos prazeres,
O mundo para ti foi negro e duro.

Atravessaste num silêncio escuro
A vida presa a trágicos deveres
E chegaste ao saber de altos saberes
Tornando-te mais simples e mais puro.

Ninguém te viu o sentimento inquieto,
Magoado, oculto e aterrador, secreto,
Que o coração te apunhalou no mundo.

Mas eu que sempre te segui os passos
Sei que cruz infernal prendeu-te os braços
E o teu suspiro como foi profundo!
(do livro Últimos Sonetos/ 1905)
(Homenagem de Florianópolis nos 150 anos de nascimento do poeta do simbolismo)

terça-feira, 15 de novembro de 2011

O Ser Quântico: uma visão revolucionária da natureza humana...


"O ruído externo já não lhe provoca nenhuma classe de alteração emocional e agora você desfruta de uma felicidade merecida!"
(Zahar, Danah. O ser quântico: uma visão revolucionária da natureza humana e da consciência, baseada na nova física)

A cientista Danah Zohar nos apresenta nesta obra, um conjunto expressivo de pontos para reflexão. Certamente sua formação em Filosofia e Física, muito contribuiu para o aprofundamento e a criatividade que empresta às suas reflexões em torno dessa temática, tão atual quanto necessária: o momento em que sofremos de crise de paradigma. Ao colocar o homem como co-autor do universo que ao mesmo tempo o integra e se desenvolve com ele, aponta a Física como o instrumento que permite vislumbrar a possibilidade de compreender o mistério da Vida e do Universo.
Fundamentada na pesquisa científica, a autora propõe uma resposta vigorosa para a antiga discussão sobre as origens e os caminhos da existência humana, percorrendo questões que vão da filosofia à física quântica e da sociologia às teorias comportamentais. Suas reflexões a cerca das diversas teorias existentes sobre o tema da Vida e do Universo, traz para a atualidade a discussão em torna do paradigma que ainda influencia o modo de fazer ciência – o newtoniano-cartesiano – e que se encontra esgotado em suas possibilidades de explicar as novas miradas ou incursões da nossa percepção sobre a complexidade dos seres e a sua dimensão de espiritualidade. A nova descoberta sobre a inteligência espiritual tem levado pesquisadores, como a autora, a cursionarem de forma científica, nesse campo de investigação, trazendo mais compreensão sobre a natureza do homem em sua concepção holística. Tal dimensão, a espiritual, está ligada à natureza humana de ter objetivo e propósito na vida e é, sem dúvida, responsável pelo significado de nossa existência. Somente com o desenvolvimento dessa dimensão podemos sonhar com um mundo melhor, onde o respeito pela outridade, presente um sentimento natural de todos. O Ser Quântico, escrito em colaboração com o psiquiatra e terapeuta Ian Marshall, esposo da autora e que muito contribuiu com suas pesquisas sobre os condensados de Bose-Einstein nos mostra caminhos bastante atraentes para percorrermos, visando uma compreensão cada vez maior, dos complexos mistérios da Vida, da Consciência e do Universo. Danah propõe um novo modelo, baseado nas idéias, na linguagem e nas imagens das novas ciências - a física quântica, as teorias do caos, da complexidade.
... ultrapassando o Narcisismo
: vivemos numa cultura narcisista, uma cultura centrada no “eu”, no “meu”, no “agora”, a autora apresenta o narcisismo como uma doença do relacionamento, uma doença resultante da incapacidade de se formar relacionamentos importantes consigo mesmo e com os outros. “Todos os sistemas quânticos do Universo, inclusive nós mesmos, estão entrelaçados (correlacionados e enredados) em alguma medida. Mesmo o vácuo quântico está repleto de correlações. Tal entrelaçamento básico é a essência da realidade quântica. (p. 118). Se faz necessário então, uma psicologia da pessoa, fundamentada na natureza quântica do ser e que enfatize todos esses relacionamentos.
... a Pessoa que Eu Sou: a autora discute as dificuldades encontradas para solucionar tal questão. Se a minha constituição material mais ínfima, as partículas subatômicas circulam constantemente em mim e para além de mim. Aqui estou, com o meu corpo feito de elementos que algum dia formou a poeira das estrelas nos quatro cantos do Universo para se tornar, por algum tempo o corpo que sou - o padrão que é unicamente a minha alma. Mas quem ou o que é este “eu” que penso que sou? O ser quântico, então, o "eu" que consideramos aquilo que somos, é
bastante real, mas ao longo do tempo revela-se mutável a cada momento, com contornos indefinidos e flutuantes. [...] Posso dizer com alguma certeza que eu sou, mas, se isso fosse tudo o que pode ser dito sobre o ser, ficaria difícil dizer quem e o que eu sou. "Uma existência flutuando de momento a momento" é só o que se tem a dizer sobre a identidade individual das partículas elementares.
... a Consciência e o Gato: a autora apresenta a experiência do gato mecânico-quântico de Schrödinger onde aquele pesquisador demonstrou que a vida ou a morte do gato é uma questão de probabilidade que preenche o espaço do experimento. As conseqüências desse experimento são as seguintes: a) A realidade acontece quando a vemos - Fenômenos quânticos não observados são radicalmente diferentes dos observados, o observador interfere diretamente no fenômeno; b) Como a realidade acontece depende de como a vemos – Na física quântica este fenômeno é chamado de “contextualismo” e este conceito é fundamental para sua proposta de uma nova visão de mundo, com suas próprias e distintas dimensões epistemológicas, morais e espirituais. c) Serão os Elétrons Conscientes? - será que a consciência está presente apenas no homem ou todos os demais seres a possuem também e nesse caso mudaria apenas o nível de consciência, a porção dela possível naquele estado de ser? “E, se [a consciência] for contínua, até que ponto se estende esta continuidade? A cães e gatos? Às amebas? Às pedras? Ou até elétrons? Já ao começar a pensar desta forma estamos experimentando uma boa mudança de paradigma.” (p. 33); d) Os outros seres vivos – Esse modelo nos permite afirmar que todos os seres vivos possuem consciência; e) Pampsiquismo - pleno e limitado – sobre esse conceito a autora é cautelosa afirmando que o estágio atual da física quântica ainda não permite afirmar com certeza categórica sobre a origem da consciência na realidade quântica.
... Consciência e Cérebro: Dois Modelos Clássicos e Um Modelo Mecânico-Quântico da Consciência a autora apresenta os três modelos mais conhecidos para a explicação da consciência e a posição e o papel que o cérebro ocupa em cada um deles. O cérebro como um computador que comanda todo o nosso corpo, a nossa psique, é certamente uma explicação bastante atraente pelas analogias que podemos fazer. “De fato, o cérebro humano é
uma complexa matriz de sistemas sobrepostos e interligados, correspondentes às
várias etapas da evolução, e o ser que dele brota é parecido com uma cidade construída ao longo das eras. [...]” (p. 42). Já o modelo holístico (o cérebro como holograma) segundo a autora também não parece dar todas as respostas. [...] Se "o cérebro é um holograma que percebe e participa de um
universo holográfico", quem está olhando para este holograma? O holograma em si não passa de uma fotografia diferente, que por si só não é sujeito do ato de perceber.[...] (p. 49).
O modelo Mecânico-Quântico da Consciência é apresentado pela autora como um fascinante instrumento de compreensão dos mistérios da vida. Autores como Penrose, Marshall e Orlov dele se servem, mas há muito ainda que esclarecer quanto a esse modelo. Questões ainda não resolvidas como: De que modo seria esse processo quântico? Quais propriedades do cérebro poderiam sustentar tal modelo? Somente respondendo a essas questões centrais é que se poderia afirmar com segurança a aplicabilidade real desse modelo. Para responder a essas
questões ela levanta outra pergunta: Que tipo de mecanismo neurobiológico seria necessário para
"alinhar" neurônios (ou algum de seus componentes) da mesma forma que as agulhas das bússolas de nosso exemplo se alinharam, por força de seus próprios campos magnéticos internos? E será viável um mecanismo desse tipo? (p.56). Para ela os condensados de Bose-Einstein com suas características singulares onde “... as inúmeras partes constitutivas de um sistema ordenado não só se comportam como um todo, mas se torna um todo — suas identidades se fundem
ou se sobrepõem de tal forma que perdem completamente a própria individualidade.” (p.56, grifo do autor). E acrescenta: “[...] Penso que essa condensação de Bose-Einstein nos componentes dos neurônios é o que distingue o consciente do não consciente. Acho que essa é a base física da consciência.” (p. 60). Finaliza afirmando que os dois sistemas, do computador e os condensados de Bose-Einstein se complementam possibilitando explicar a questão da formação da consciência ao
nível quântico. (...)
(Fonte:Revista Pesquisa Psicológica/ Online - Coordenação Pedagógica do Curso de Psicologia do CESMAC - Alagoas, Brasil/ ww.pesquisapsicologica.pro.br )

Ψ Novo Amor

imagem: Veronese

Ψ A psicanálise, dizia Lacan, não foi capaz de inventar um novo pecado, uma nova perversão; talvez, fica a pergunta, seja capaz de inventar um novo amor que não seja voltado ao pai em última instância, mas que, sabendo dele se servir, possa ir além do chamado, em psicanálise, gozo fálico e captar algo do real feminino. Tanto a globalização, quanto a psicanálise de hoje, revelam que entramos em um novo momento, mais propício à essência feminina. Muito da epidemia depressiva de nossos dias fica esclarecida pela desorientação ocasionada pela perda da orientação masculina. Lacan previu estes acontecimentos e deixou os instrumentos para tratá-los: um analista do futuro
(Publicado em O Estado de São Paulo e em Opção Lacaniana: revista brasileira internacional de psicanálise. n.32, de dez.2001, p.5253 São Paulo).

domingo, 13 de novembro de 2011

ou para quem desacreditado do amor queira voltar a amar...

imagem: Sérgio Surkamp

Barthes, combinando citações e suprimindo aspas parece confirmar que "não se copiam obras, copiam-se linguagens". Na linguagem dos enamorados como seres solitários e incompletos, o discurso do amor surge como sentimento incompreensível. "O apaixonado é, portanto, artista e o seu mundo é bem um mundo às avessas, pois toda a imagem é o seu próprio fim (nada para lá da imagem)". Em cada verbete, o sujeito do discurso amoroso registra as angústias mais veementes de um coração apaixonado e nos faz refletir acerca de ações banais, como a espera de um telefonema (ou a dúvida quanto a ligar ou não), o ciúme inexplicável que sentimos a ver um terceiro falando do nosso ser amado ou simplesmente o delírio da paixão amorosa.
Ciúmes, posses, discursos, signos, o desejo amoroso - trata-se de um livro para quem ama poder amar ainda mais (FDA). Para quem amou, sentir saudades e querer amar novamente. Ou para quem ainda desacreditado no amor, queira um dia voltar a amar, mas que não se contente com qualquer amor, e sim procure um amor ao menos parecido com aquele descrito por Barthes. "Os signos do amor alimentam uma imensa literatura: o amor é representado, reposto numa ética das aparências".
Gozo da palavra romanesca, gozo por articular significantes - ao lado da leitura barthesiana que desvenda sentidos, gozo de criar, de reinventar o objeto do prazer, o prazer do texto, o prazer de ler, o prazer de amar puro e simplesmente!

BARTHES, Roland. Fragmentos de Um Discurso Amoroso. Editora Martins Fontes, 2003.
BARTHES, Roland. O prazer do texto. Trad. Maria Margarida Barahona. São Paulo: Perspectiva, 1977.
BARTHES, Roland. Escrever...Para que?...Para quem? Trad. Raquel Silva. Lisboa: 1974

sábado, 12 de novembro de 2011

Se tagarelar é um insulto, poetizar é uma bênção!

Um poema é capaz de dissolver a dor, levar prá longe aquele soluço que engasgou... Pode ser até que a poesia faça você sonhar novamente!
Em "Asas do Desejo" (Wenders), o desejo do anjo é ser humano, por amor a uma mulher.
Diz: " ... eu sei agora, o que nenhum anjo sabe". O que o anjo descobriu é que sendo mortal é no desejo que se busca a imortalidade.

... e o desejo humano é insaciável Estar totalmente completo é impossível! O desejo é definido pelo vazio, pela falta...
Um desejo aponta sempre para outro desejo... e agimos insanamente quando perseguimos esta crença de que existe um ou vários objetos que a vida feito um mercado acabará por suprir... Ilusão que tenta responder pelo nome de felicidade! Segundo Lacan, o Inconsciente é da ordem do não realizado e é estruturado como uma linguagem simbólica. Os símbolos são criados devido a ausência da coisa. E falta sempre algo, só mais um drink, mais um pouco de ar, eu só queria dizer mais uma coisinha... E a vida é sofrimento, quanto mais se goza, mais dor. Mas o poeta, o artista, lida com o impossível, tentando revelar o real. Insiste, insiste no desejo, ou nele o desejo insiste, de fazer uma nova poesia. Quem sabe desta vez eu consigo expressar o que verdadeiramente sinto!

domingo, 16 de outubro de 2011

(...) somos instantes

imagem: George Kotsones
 Deus não permita que nada mais perturbe minha alma já perturbada. Não fique entediado por ter me criado... eu também estou decepcionada. Só peço que continues olhando por mim... sei que esta prece não é teu alimento, pois vives muito bem sem ela... e sei que vives muito bem sem mim. Eu é que não existo sem Ti!
Prefiro a noite, me acerto com meus fantasmas, só dispenso as noites frias e chuvosas... Já em noite de lua cheia, meus fantasmas ficam mais apresentáveis. Entretanto, durante o dia, tudo fica mais difícil, aí são os humanos que me desconcertam: eles falam e riem demais... uma lástima!
SOBRE OS ELOGIOS: Ela reclamou das purpurinas: me conheço, não sou assim tão maravilhosa e nunca fui flor que se cheire... ou, para santa não sirvo, tenho lá meus defeitos, dos quais sei de cor e salteado.
Então ela diz ficar perplexa e assustada com os elogios. É que ela tem recebido mel e fel, não necessariamente nesta ordem, pois seus dias tem sido mais amargos ultimamente.
Isso porque ela é de difícil contato, reservada, se fosse mais sociável, estaria toda estropiada. Me contou outro dia, que acordou toda quebrada, tinha recebido outro golpe daqueles gratuitos, que a vida dá de bandeja e fica à espreita, cínica e debochada, vendo como ela iria se virar... Diz ela, que está preparando uma surpresa para a vida... Deixe estar...
DAS RELAÇÕES DE PODER: São só vaidades, frivolidades, jogos, prepotências... Tudo passa, nos labirintos do poder esconde tua pequenês. Lembre-se sempre, que grande parte das relações interpessoais não passam de projeções, portanto, fique atento ao olhar alguém de cima. É tua própria insignificância que estais contemplando. Não sejas tão rude, nem tão condescendente, tente acima de tudo ser justo.

EU NÃO SOU LOUCO”: na ânsia pela normalidade, mata-se a singularidade, o que se tem de mais genuíno. A unanimidade das massas tem comprovado que não é tão lúcida. Ser domesticado também cansa. O “homo sapiens” está se transformando em "homo suínus". O mundo transformou-se num banquete onde o porco come o próprio pernil. E louco são os que não participam da orgia... quem preserva sua ética, sua identidade não negocia sua alma, digo, sua liberdade, seu voto, esse é o insano.
(...) o rio segue seu curso e não se repete, assim como não se pode ser infeliz duas vezes da mesma maneira tanto a minha infelicidade quanto a do mundo, são momentos únicos. 
Ela diz estar desconfortável no mundo, e diz que escrever é tagarelice às avessas.
Eles não toleram o silêncio, meu Deus como falam... e quando perturbados pelo excesso das palavras insanas, invadem o silêncio alheio. Então avançam sinal, com ruídos desarticulados que eles chamam de linguagem.
O mundo é uma bola cheia de letras, ruídos, sons mal articulados e buzinas, até os pássaros estão confusos. Não vou dizer que o mundo é de todo mal, que as pessoas são perversas e tal, mas posso afirmar sem medo de errar, que esse mundo do jeito que vai é o pior lugar para ser feliz... e viver nesta tagarelice é o pior castigo,  o inferno são os outros?

"Tudo é uma questão de manter a mente quieta, a espinha ereta e o coração tranquilo."
(Fatima Vieira in: fragmentos dos cinquenta minutos que valeram à pena)

(...)

"No fim tu hás de ver que as coisas mais leves são as únicas que o vento não conseguiu levar:
um carinho no momento preciso
o folhear de um livro de poemas
o cheiro que tinha um dia o próprio vento."
(Mario Quintana)













Ψ personalidades dominadas pelos instintos


Ψ ADIÇÃO A DROGAS: A palavra ADICÇÃO insinua a urgência da necessidade e a insuficiência final de todas as tentativas de satisfazê-la. Existem adictos sem drogas (dependentes de comida e outros). O que difere as drogas de outras adicções é o seu efeito químico. Mas o que vai determinar a patologia enfim, é a estrutura psicológica do paciente.
A busca primeira é repor o que fica perdido, repor a incompletude com objetos ideais, com coisas substitutas. Tenta-se a defesa da angústia com um objeto postiço, procurando-se encontrar uma peça móvel que supra esta incompletude. Esta busca por coisas que possam tapar este buraco, impreenchível, pode-se tornar intensa.
As drogas, o álcool, os remédios, a comida, os jogos, as compras... constituem promessas irrecusáveis de recuperar esta fenda. A perda irreparável imposta pela realidade torna-se precisamente a perda destes objetos substitutos. A ausência do objeto é intolerável, produz abstinência e angústia. O mercado sabe muito bem tirar proveito desta falha humana. Fornece substitutos, escravizando o consumidor. Os efeitos que os drogadictos buscam são sedativos ou estimulantes. O adicto é aquele para quem o efeito de certa droga tem significado sutil, imperativo. Ele passa a depender deste efeito, dependência esmagadora a ponto de anular todos os demais interesses. Todos esses desejos vão sendo substituídos pelo "desejo farmacológico."

Esses indivíduos apegam-se a toda oportunidade de fugir com mais presteza da dor, sofrimento e frustrações. A droga ingerida via oral remete ao estádio arcaico do desenvolvimento libidinal antes de qualquer organização, ou seja, a orientação oral do bebê que pede gratificação sem capacidade de troca, pois neste estádio não se tem uma construção de realidade que permita o dar e receber.
Ao se constituir como sujeito, ao ocupar um lugar no discurso, o falante esvazia o objeto. Lacan dá o exemplo do lactente quando diz: é a criança que se desmama, é a criança que se separa do peito, na medida em que se constitui sujeito. Podemos pensar que é o usuário que dispensa a droga, que não adianta separá-lo da droga se ele a quer. Como a criança de peito, que busca somente a satisfação da nutrição, isto esmaga a demanda de amor em relação à mãe. Não é a solução do desejo. Sua função é a de satisfação da necessidade. O desejo é outra coisa. Os programas relativos a drogadição deveriam apontar, então, para o sujeito.já a droga via seringa, como qualidade simbólica genital remete ao prazer que o indivíduo obtém pela pele, sendo de índole passivo-receptiva.
A droga eleva a autoestima, e enquanto durar esta exaltação as agitações eróticas e narcísicas são supridas. SIMMEL, fala em "mania artificial", a exaltação produzida pelas drogas. Observa-se que nas fases finais da doença os adictos alternam períodos de exaltação e "depressão do dia seguinte", que é o equivalente da alternância entre a fome e a saciedade do bebê ainda psiquicamente indiferenciado. No final a agulha é usada menos pelo prazer e muito mais pela proteção (inadequada) contra uma tensão intolerável, que se relaciona com a fome eo sentimento de culpa.A fantasia de imortalidade, a certeza da indestrutibilidade do corpo, de que o corpo não se estraga, induz o adito a licenciosidades possíveis e impossíveis para testar limites (?) .
Não se trata, nesta idéia, de uma conformação das escolhas dos gozos, ao contrário, o sujeito fissurado já está conformado. Ele não tem mais escolha. Não se trata somente de um epsódio obsessivo, mas principalmente de uma exclusão do real da morte, o que autorizaria a banalização de doenças. Isso ocorre, nas rodas de seringas, onde a circulação de restos de sangue e de secreções abre possibilidades de contaminação. Então, paga-se com o corpo.

PSICOTERAPIA NAS NEUROSES IMPULSIVAS E NAS ADIÇÕES: Admite-se que o tratamento Psicoterapêutico deve ser tentado sempre que possível. Se se deixar inalterar a disposição pré-mórbida do adicto após a retirada da droga, o paciente não tardará a sofrer a recaída. A Psicoterapia não combaterá o EFEITO QUÍMICO da droga, mas o desejo mórbido de ficar inebriadamente exaltado e eufórico.
Quanto mais recente a ADIÇÃO, melhor o prognóstico.
Já em outras formas de comportamento impulsivo o prognóstico vai depender primeiro dos mesmos fatores que influem nas perversões e segundo, da forma porque a intolerância à tensão responde ao tratamento.
 Faz-se necessário aumentar a consciência da doença no paciente e reforçar-lhe o desejo de cura antes de iniciar a Psicoterapia propriamente dita. Lacan fala da estrutura subjetiva enquanto nó borromeano (1976 - 1977).
É a partir do corte deste nó que a estrutura pode ser analisada. Este corte faz cair o objeto a e possibilita ao gozo entrar no discurso. Trata-se, então, de mudar de posição para constituir um sujeito em um significante para outro significante, e não mais para um objeto.
Quando se toma um sujeito em análise, toma-se-o pelo seu discurso; portanto, o que está em análise é efeito de discurso. O corte do nó, por sua vez, possibilita que o gozo entre no discurso, porque ocorre uma mudança de registro. Muda a condição de escuta do analisando, amarrando-se de outro jeito. Nesta perspectiva, o que acontece nas adições é a busca da totalidade, da solução imediata, que dispensa o falante de confrontar-se com o desejo, pois o que ele não quer é, justamente, pagar o preço da castração. [...] temos o discurso analítico que, quando se aceita entendê-lo como o que é, se mostra ligado a uma curiosa adaptação porque, se é certa esta história de castração, quer dizer que no homem a castração é o meio de adaptação à sobrevivência" (Lacan, 1971-1972).
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA 

 FENICHEL, Otto - Teoria Psicanalítica das Neuroses - Livraria Atheneu - Rio de Janeiro - São Paulo - 1981
FREUD, S. (1937). Análise terminável e interminável. In: ______. Ed. Standart brasileira das obras completas de Sigmund Freud. Ed Standart Brasileira das Obras Completas de Sigmund Freud. 2. ed. Rio de Janeiro, 1974.
LACAN, J. De uma questão preliminar a todo tratamento possível da psicose. In: ______.
Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998. ________. As psicoses.

O Seminário III. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1985.
Adão Luiz Lopes da Costa, *DROGAS. PAGAR COM A CARNE? *
(Fatima Vieira - Psicóloga Clínica)

Ψ outros fragmentos dos cinquenta minutos que valeram à pena...

Prefiro a guerra das flores a mais humana das lutas.
Aos que fracassaram muitas flores, aos outros a semente... 

Há que se semear e muito, até colher as belas flores e a fragrância do canteiro alheio nem sempre é mais doce...
… mas preciso aprender a dizer Bom Dia! como todo mundo, é que pela manhã meus fantasmas ainda ruminam.
Um colar, brinco e anel, o batom, é claro! Falar o necessário, comer idem... Tenho a impressão que toda "falácia" é só para protelar o que tem que ser feito!
Pois nas longas noites de inverno meus sonhos não tem sido tão coloridos, acabo aquecendo meus fantasmas e todos os outros do inconsciente coletivo.
Começa mais um dia sabe como eles se cumprimentam? Bommm Diaaaa!!!!
 (e no decorrer do expediente, tratam de esmagar o dia do outro).
Tem dias que as palavras como seiva doce descem macias, em outros seiva amarga destilam seu veneno e me maltratam... Eu sei o que estou dizendo!
Escrevo para preencher espaços vazios da alma. Tem dias que minha alma não aceita palavras derramadas, ela quer poesia elaborada, mas não tenho paciência para rimas nos dias em que sou um vendaval solto, um mar revolto, um bicho acuado... poesias desconexas... um dia saberei o que dizer!
E vou além, nada mais me assusta, a morte até perdeu seu mistério... o segredo? É viver o aqui e agora, ainda que certos momentos sejam de puro tédio. A felicidade até existe "quem foi que disse que a vida é somente riso nunca pranto, como se fosse a primavera, não é tanto..." (João Bosco)
Por vezes fico só e quieta olhando o nada, (a morte deve ser um pouco isso), não me sinto nem aflita nem feliz, apenas vivo! Não é porque cantam os pássaros que são mais felizes, eu já ouvi tristes melodias e em dias ensolarados!
A chuva barulhenta, o inverno gelado, o vento raivoso não mais me afligem, nem choro mais... Lágrimas também secam após um certo tempo.
Eu escrevo por puro desespero e por autocompaixão, é uma forma de continuar existindo. Mas dói o meu ombro direito... Meu Deus e quando eu não poder escrever meus delírios???
São apenas fragmentos de uma vida vivida e sofrida que escolheu o silêncio e a solidão como companhia mas aceita outras solidões avulsas...
Não é que não me reste mais nada, tenho até um animal de estimação, uma abelha e tenho as violetas logo, não sou tão só assim...
Os dias nublados foram longos e deixaram marcas, eu não devo mais nada a ninguém, e quanto à vida parei de reclamar, estamos quites !
Sobre o Amor: Ah esse é tão delicado e forte... quando correspondido é o êxtase, do contrário, SINTHOMA!
 Ele estava ao seu lado o tempo todo, a dama envolvida com a sua dor não o via...
(Fatima Vieira in: fragmentos dos cinquenta minutos que valeram à pena)

.. que anjos suaves te guardem!




















imagem : Farncisco Botelho

sábado, 1 de outubro de 2011

Ψ suportar a culpa é preferível à angústia.

imagem: boris kustodiev
Angústia: O desamparo biológico do bebê leva-o a estados de alta tensão dolorosa, onde o organismo é inundado por quantidades de excitação que lhe excedem a capacidade de controle, são chamados de estados traumáticos.

- O sofrimento dos estados traumáticos inevitáveis dos primeiros anos de vida, ainda indiferenciados, ainda não idênticos a afetos definidos ulteriores representa a raiz comum de vários afetos futuros, e também, da angústia.

 As sensações desta "angústia primária", podem ser consideradas de um lado, como a maneira pela qual a tensão se faz sentir e, por outro, como a percepção de descargas de emergência vegetativas involuntárias.

- A angústia primária não é criada pelo ego; é criada por estímulos externos e internos, ainda incontrolados; na medida em que ela se experimenta como sentimento doloroso consciente, é experimentada passivamente, tal qual alguma coisa que ocorre ao ego e tem de ser aturada.

- Em pessoas que tem que suportar fatos traumáticos, ocorrem experiências que são comparáveis à angústia primária. Os ataques incontroláveis de angústia esmagadora, que se sentem como alguma coisa terrível a inundar uma personalidade desamparada, constituem sintoma típico de neuroses traumáticas.

 - Tipo semelhante ocorre na excitação sexual (e talvez agressiva também), quando não se permite que siga seu curso normal. Daí ser provável que a angústia traumática ou pânico, seja a mesma coisa que a angústia primária: a forma pela qual uma insuficiência de controle, (um estado de que se está inundado de excitação) é passiva e automaticamente sentida.

- Quando a criança aprende a controlar seus movimentos, atos intencionais pouco a pouco vão tomando o lugar das simples reações de descarga; a criança já pode prolongar o tempo entre o estímulo e a reação, com o que realiza certa tolerância da tensão.

- A capacidade de "ir tentando" que assim se adquire altera a relação do ego para com os seus afetos. Estes são síndromes de descargas arcaicas que suplantam os atos voluntários em certas condições excitantes.

- O ego em desenvolvimento já aprende a "amansar" afetos e usá-los para os próprios fins intencionais. Isto também se aplica à angústia.

- Com a imaginação previsora, mais o planejamento resultante de atos ulteriores adequados, forma-se a ideia de perigo. O ego julgador declara poder tornar-se traumática uma situação que ainda não o é, juízo, que cria condições semelhantes às que são criadas pela própria situação traumática muito menos intensas. Isto o ego também experimenta como angústia, mas é imensa a diferença entre este temor e a angústia original.

- Já não é o ataque esmagador de angústia, e sim temor mais ou menos moderado que se experimenta como angústia, e sim temor mais ou menos moderado que se experimenta e que se utiliza como sinal ou medida protetora.

- Esta angústia, por assim dizer o que pode acontecer. Os componentes intencionais que se mostram na angústia ante o perigo são de creditar-se ao ego julgador; os componentes não intencionais qual seja a possibilidade de paralisia, devem-se ao fato de o ego não produzir angústia, mas só usá-la: não tem meio melhor de que disponha.

- Há vezes em que a expectativa do perigo, em lugar de precipitar o temor intencional que sirva para evitar o estado traumático, precipita este estado mesmo.

- O juízo que o ego faz "perigo à vista" é seguido de pânico esmagador ; o ego produziu algo que não pode controlar.

- A tentativa de amansar a angústia terá falhado; o pânico selvagem original reaparece e esmaga o ego. É o que se dá quando o organismo se acha em estado de tensão que se pode dizer consistir em disposição latente para o desenvolvimento de pânico.

- Neste caso, o juízo de perigo feito pelo ego atua como se fosse fósforo em barril de pólvora. A intenção de acender o fósforo como sinal falha porque liberta uma força considerável, incomparavelmente maior do que os poderes limitados da força que tentou usar o fósforo.

- O que determina o conteúdo das ideias de angústia do ego primitivo são, em parte, diretamente, a sua natureza biológica; em parte, indiretamente, os seus modos animísticos de pensar, pelos quais o ego acredita ter o seu ambiente os mesmos objetivos instintivos que ele próprio os tem (associados a poder muito maior).

- Nestes mal entendidos animísticos funciona a lei primitiva de talião, segundo a qual todo ato pode ser desfeito (ou tem de ser punido) por um ato semelhante que se volta a quem o praticou. A mais fundamental das angústias parece ligar-se à incapacidade fisiológica do bebê de satisfazer ele próprio seus impulsos.

- O primeiro temor é o temor (não verbal) da experiência de estados traumáticos ulteriores.  A ideia de que as exigências instintivas possam ser perigosas (o que constitui a base derradeira de todas as psiconeuroses) está neste temor enraizada.

- Entretanto, não quer isto dizer que o ego hostil aos impulsos instintivos desde o começo mesmo, ou sempre receoso de que as aspirações demasiadas intensas o invadam. Visto que o ego aprende a controlar e a satisfazer, ativamente, os respectivos impulsos, não haveria necessidade de produzir-se angústia deste tipo uma vez realizada esta capacidade; os adultos normais de fato, não temem os seus impulsos.

- Há neuróticos que ainda têm medo da experiência da sua própria excitação, quando esta excede certa intensidade; mas não se dá isto pelo fato de uma “angústia primária da intensidade da excitação”, e sim pela circunstância de que outros tipos de angústia os fizeram bloquear o curso natural das excitações transformando o prazer, secundariamente, em desprazer intenso.

- Existe o temor de que deixem de chegar meios extremos de satisfação. É o “medo da perda do amor”, ou perda de ajuda e proteção; medo que é mais intenso do que seria, se apenas representasse juízo racional de um perigo verdadeiro, porque a autoestima dos primeiros tempos é regulada mediante provisões externas, de modo que a perda da ajuda e proteção também significa perda da autoestima.

- Um ego que for amado sente-se forte; um ego abandonado é fraco e está abandonado ao perigo. Um ego que é amado teme a possibilidade de abandono. O modo animístico de pensar e sentir complica as questões. Se uma criança fantasia que devora o seu ambiente, e depois sofre uma repulsa, fantasiará que os pais podem comê-lo, é desta maneira que se originam as angústias fantásticas de destruição física. O que de forma mais importante representa este grupo é a angústia de castração, que se transforma no motivo principal das atividades defensivas do ego.

- As maneiras pelas quais o ego normal aprende a superar suas angústias primitivas e ainda são amansadas são muito características. Sempre que o inunda uma quantidade muito grande de excitação, o organismo tenta livrar-se dela mediante repetições ativas ulteriores da situação que haja induzido a excitação excessiva. É o que ocorre nas nas primeiras brincadeiras das crianças pequenas, tanto quanto os sonhos delas. Só há uma diferença fundamental entre a inundação original de excitação e estas repetições: na experiência original, o organismo foi passivo, nas repetições ele é ativo, determinando o tempo e o grau de excitação.

- De início, as experiências passivas que deram causa à angústia, a criança as reproduz ativamente quando brinca, a fim de realizar um controle que foi adiado. Mais tarde, ela não só dramatiza as experiências passivas que deram causa à angústia, como também antecipa o que espera que aconteça no futuro; a criança as reproduz ativamente quando brinca, a fim de realizar um controle que foi adiado. O uso do medo como sinal mais não é que um exemplo do uso intencional desta antecipação.

- Quando descobre que já consegue superar sem medo uma situação que, antes, a teria esmagado de angústia, a criança apresenta certo tipo de prazer , o qual tem a característica de “não preciso mais sentir angústia”.

- Faz que a brincadeira da criança envolva as simples tentativas de descarga para o controle do mundo exterior mediante a prática repetida. O “prazer funcional” é prazer não pela gratificação de certo tipo específico de instinto, mas pelo fato de que de que o exercício de uma função já é possível sem angústia. É o mesmo prazer que faz as crianças gostarem de repetições intermináveis da mesma brincadeira ou da mesma história a qual tem de ser contada exatamente com as mesmas palavras.

- Sob o ponto de vista econômico, pode-se explicar este prazer da seguinte forma: um dispêndio de energia associa-se à angústia ou à expectativa receosa sentida pela pessoa que não está certa se conseguirá controlar uma excitação esperada.

- A cessação súbita deste dispêndio acarreta a sua descarga aliviadora a qual o ego bem sucedido experimenta como sendo um “triunfo” e goza como prazer funcional.

- Em geral, o prazer que se origina desta fonte condensa-se como prazer erógeno, e este, por sua vez, foi possibilitado pela superação da angústia. Quando um adulto atira uma criança para o alto e torna a apanhá-la, ela sente, de um lado, prazer que resulta da superação do medo de cair. Se tiver certeza que não a deixarão cair, pode sentir desprazer por ter pensado que podiam largá-la; sobressalta-se um pouco, mas depois percebe que não precisaria ter receado. Para possibilitar o prazer, é preciso que se cumpram condições tranquilizadoras: a criança há de ter confiança no adulto que com ela brinca , de modo que com o tempo, se produz a aprendizagem pela prática. Depois da experiência repetida mostra ser infundado o temor, a criança fica mais corajosa. Quer a angústia, quer o prazer funcional cessam quando o ego está seguro de si e já não mantém expectativa angustiante.

- Os adultos já não sentem prazer de espécie alguma quando se envolvem em atividades mais do que familiares e automáticas de que se orgulhavam quando pela primeira vez as realizaram quando crianças.

- Nos neuróticos, uma defesa patogênica pode perturbar os temores infantis. As angústias permanecem efetivas, quase todas bloqueando inteiramente as atividades “perigosas”.

- Há vezes em que também se repetem os modos de combater a angústia, e o ego pode experimentar “prazer funcional” na superação do medo mediante repetições da atividade que se teme.

Referência Bibliográfica: FENICHEL, Otto - teoria Psicanalítica das Neuroses. Tradução: Dr Samuel Reis. Livraria Atheneu - Rio de Janeiro, São Paulo, 1981

(Fatima Vieira - Psicóloga Clínica)
 

... embora eu quisesse tudo, tudo me faltou





"Qu' il était bleu, le ciel!

sexta-feira, 30 de setembro de 2011

quando o homem chora...


O ELOGIO DAS LÁGRIMAS - FUNÇÃO DAS LÁGRIMAS - Chorar : Propensão particular do sujeito amoroso a chorar: Modos de aparição e função das lágrimas nesse sujeito. A menor emoção amorosa de felicidade ou aborrecimento põe WERTHER em lágrimas. WERTHER chora copiosamente. Ele é o amante que chora ou é o ramântico?
... Liberando suas lágrimas sem nenhuma repressão, o amante segue as ordens do corpo amoroso, que é um corpo banhado, em expansão líquida: chorar junto: lágrimas deliciosas fecham a leitura de KLOPSTOCK que Carlota e Werther fazem em comum. De onde o amante tira o direito de chorar, senão de uma reviravolta dos valores que coloca o corpo como primeiro alvo? Ele aceita recuperar o corpo criança.
- SCHUBERT: Além disso, aqui, o corpo amoroso tem como duplo um corpo histórico. QUEM ESCREVERÁ A HISTÓRIA DAS LÁGRIMAS? EM QUE SOCIEDADES, EM QUAIS ÉPOCAS SE CHOROU? DESDE QUANDO OS HOMENS (E NÃO AS MULHERES) NÃO CHORAM MAIS? POR QUE A "SENSIBILIDADE" É, EM CERTO MOMENTO, TRANSFORMADA EM "SENSIBILISMO"?
- As imagens de virilidade são movediças; os gregos, os homens do século XVII choravam muito no teatro; São Luís, no dizer de MICHELET sofria por não ter recebido o dom das lágrimas; numa ocasião em que sentiu lágrimas deslizarem-lhe suavemente pelo rosto, "elas lhe pareceram tão saborosas e suaves, não apenas para o coração, mas também para a boca".
- SCHUBERT, "lobder thränem" [elogio das lágrimas], poesia de A. W. Schlegel.
(...) nas lágrimas mesmas do amante, nossa sociedade reprime, fazendo assim do amante que chora um objeto perdido, cujo recalque é necessário para a sua "saúde".
- No filme "A MARQUESA de O", o amante chora e os outros caçoam.)
- Talvez "chorar" seja por demais abrangente; talvez não se deva reduzir todas as lágrimas a uma mesma significação. Talvez haja, no mesmo enamorado, diversos sujeitos que assumem modos semelhantes, mas diferentes de "chorar". QUEM É ESSE EU QUE "TEM LÁGRIMAS NOS OLHOS"? QUEM É AQUELE OUTRO QUE, TAL DIA, ESTEVE " À BEIRA DAS LÁGRIMAS"? QUEM SOU EU, EU QUE CHORO "TODAS AS LÁGRIMAS DO MEU CORPO? ou que derramo ao acordar, "UMA TORRENTE DE LÁGRIMAS"?
- Se tenho tantas maneiras de chorar é, talvez, por sempre me dirigir, quando choro a alguém e por NÃO SER SEMPRE O MESMO DESTINATÁRIO de minhas lágrimas: adapto meus modos de chorar ao tipo de chantagem que, por minhas lágrimas, pretendo exercer à minha volta.
- Chorando, quero impressionar alguém, fazer pressão sobre ele ("veja o que você está fazendo comigo").
- Pode ser - e é comumente - o outro que coagimos assim a assumir abertamente a sua comiseração ou a sua insensibilidade; mas pode ser também eu mesmo: obrigo-me a chorar para provar a mim mesmo que minha dor não é uma ilusão: AS LÁGRIMAS SÃO SIGNOS, NÃO EXPRESSÕES. Por minhas lágrimas, conto uma história, produzo um mito da dor e assim posso acomodar-me a ela: posso conviver com ela, porque, chorando, dou-me um interlocutor enfático que recolhe a mais "verdadeira" das mensagens, a de meu corpo, não a de minha língua: "PALAVRAS, QUE SÃO PALAVRAS? UMA LÁGRIMA DIRÁ MUITO MAIS." (Schubert)
BARTHES, Roland - Fragmentos de um Discurso Amoroso
(Fatima Vieira - Psicóloga Clínica)