- Semiólogo, Ensaísta e Crítico Literário Francês, Barthes extrapola, praticamente todos os dias, até enfim 15 de setembro de 1979, os sentimentos que invadiam sua mente a respeito da morte, solidão e existência com a perda materna...
- No final da vida, cheio de melancolia pela ausência da mãe e entediado, Barthes entrega-se ao recolhimento, volta ao seu baú sentimental e parte em busca do tempo perdido. O que nos faz rememorar sua obsessão pelos escritos proustianos, sobretudo porque é ali que ele encontra o estilo de romance que aprecia: anamnésico: "(...) romances que amo (...) [são aqueles] feitos com materiais (lembranças) evocadas da infância da vida do sujeito.
Proust fez disso a teoria de sua obra (...)." (Barthes, 2005).
- "O Diário de Luto" propõe uma profunda e dolorosa parcela da vida íntima transtornada por uma perda: a mãe, Henriette Binger, que nasceu em 1893 e casou-se com Louis Barthes aos 20 anos de idade, e mãe aos 22 e no ano seguinte viúva de guerra, falecendo em Paris aos 84 anos, o que foi para Barthes um grande golpe. Pela ausência do pai a mãe tornara-se figura central na vida do semiólogo.
Barthes morreu em 1980, atropelado ao atravessar a rue des Écoles, em frente ao Collège de France.
Fonte: Fontanare, Rodrigo. Roland Barthes. A Dor do Luto. Revista Criação & Crítica, São Paulo. Diário de Luto - Roland Barthes - Ano 2009 - Editora: Edições 70 (Trad. Álvaro Manuel Machado).
Fatima Vieira - Psicóloga Clínica.
sábado, 31 de março de 2012
sexta-feira, 23 de março de 2012
pantera negra deliberadamente solitária na noite negra...
O que representa a pantera nos sonhos?
Diz-se que é um símbolo do desejo, das pulsões reprimidas, dos desejos inconfessáveis. A cor negra, símbolo do inconsciente e a fera, energia sexual, primitiva, instintual.
As características mítico-simbólicas da pantera: o feminino-lunar, a eroticidade, a sensualidade, a sedução, a doçura do perfume que embriaga (e pode sufocar), a suavidade da pele de veludo negro, a flexibilidade, a instabilidade psíquica, a metamorfose, a ferocidade, o pavor, a paralisia e a morte.
Ela pode sinalizar o lugar onde os instintos foram lesados. agindo como uma curadora, aquela que vem lamber as feridas do sonhador até reparar os danos causados pelos recalques, medos...
Assim refere Clarice Lispector, em um trecho de Água Viva: “o excesso de mim chega a doer”. E fala do seu encontro com a pantera: "E quando estou excessiva tenho que dar de mim. Como o leite que se não fluir rebenta o seio. Livro-me da pressão e volto ao tamanho natural. A elasticidade exata, elasticidade de uma pantera macia".
A pantera não é apenas medo e sexualidade reprimida. É um “vir a ser”. São as potencialidades adormecidas que se náo forem encaradas paralisam. A pantera enjaulada. Diz Clarice: "Uma pantera negra enjaulada. Uma vez olhei bem nos olhos de uma pantera e ela me olhou bem nos meus olhos. Transmutamo-nos. Aquele medo. Saí de lá toda ofuscada por dentro, o "x" inquieto. Tudo se passara atrás do pensamento. Estou com saudade daquele terror que me deu trocar de olhar com a pantera negra. Sei fazer terror".
(Fatima Vieira)
Diz-se que é um símbolo do desejo, das pulsões reprimidas, dos desejos inconfessáveis. A cor negra, símbolo do inconsciente e a fera, energia sexual, primitiva, instintual.
As características mítico-simbólicas da pantera: o feminino-lunar, a eroticidade, a sensualidade, a sedução, a doçura do perfume que embriaga (e pode sufocar), a suavidade da pele de veludo negro, a flexibilidade, a instabilidade psíquica, a metamorfose, a ferocidade, o pavor, a paralisia e a morte.
Ela pode sinalizar o lugar onde os instintos foram lesados. agindo como uma curadora, aquela que vem lamber as feridas do sonhador até reparar os danos causados pelos recalques, medos...
Assim refere Clarice Lispector, em um trecho de Água Viva: “o excesso de mim chega a doer”. E fala do seu encontro com a pantera: "E quando estou excessiva tenho que dar de mim. Como o leite que se não fluir rebenta o seio. Livro-me da pressão e volto ao tamanho natural. A elasticidade exata, elasticidade de uma pantera macia".
A pantera não é apenas medo e sexualidade reprimida. É um “vir a ser”. São as potencialidades adormecidas que se náo forem encaradas paralisam. A pantera enjaulada. Diz Clarice: "Uma pantera negra enjaulada. Uma vez olhei bem nos olhos de uma pantera e ela me olhou bem nos meus olhos. Transmutamo-nos. Aquele medo. Saí de lá toda ofuscada por dentro, o "x" inquieto. Tudo se passara atrás do pensamento. Estou com saudade daquele terror que me deu trocar de olhar com a pantera negra. Sei fazer terror".
(Fatima Vieira)
ela um dia chegou a pensar que o mar existia para fazê-la feliz
“A ilha é uma pequena estrela que o espaço esqueceu.”
(Rainer Maria rilke)
Ela sempre morou na ilha
mas não quis mais ver o mar
Ela que um dia chegou a pensar
que o mar só existia para fazê-la feliz...
Agora diz que o som do mar
já não soa como antes,
Sonoro mar sem fundo, mar sem fim,
E isso a deixou espantada
Antes, triste ou feliz,
o seu habitat era o mar...
Quando nem a flor basta
e o mar já não seduz,
é bem possível que ela tenha desistido mesmo!
- Pensava: Imperfeição, como amar tão frágil mundo,
onde tudo nos quebra e emudece
onde tudo nos mente e nos separa
Amigos que partiram, traíram,
ou quebraram a cara contra o tempo.
Cafezinhos, vinho, frutos do mar,
prá que se não há paladar,
e ninguém prá comemorar?
Ela olhava o nada e tudo a (des) encantava...
- Pensava: O vento há de levar meus cansaços
Um certo dia decidiu: prá que falar?
... e desde então não disse mais nada.
Resolveu vez ou outra sorrir algo,
falar algo, comer algo,
... é que o desejo não cessa
mesmo quando não se quer mais nada
também é desejar.
Desejo mórbido desejo
estranho desejo,
que não cessa de desejar!
(Fatima Vieira - Florianópolis, outono/2011)
(Rainer Maria rilke)
Ela sempre morou na ilha
mas não quis mais ver o mar
Ela que um dia chegou a pensar
que o mar só existia para fazê-la feliz...
Agora diz que o som do mar
já não soa como antes,
Sonoro mar sem fundo, mar sem fim,
E isso a deixou espantada
Antes, triste ou feliz,
o seu habitat era o mar...
Quando nem a flor basta
e o mar já não seduz,
é bem possível que ela tenha desistido mesmo!
- Pensava: Imperfeição, como amar tão frágil mundo,
onde tudo nos quebra e emudece
onde tudo nos mente e nos separa
Amigos que partiram, traíram,
ou quebraram a cara contra o tempo.
Cafezinhos, vinho, frutos do mar,
prá que se não há paladar,
e ninguém prá comemorar?
Ela olhava o nada e tudo a (des) encantava...
- Pensava: O vento há de levar meus cansaços
Um certo dia decidiu: prá que falar?
... e desde então não disse mais nada.
Resolveu vez ou outra sorrir algo,
falar algo, comer algo,
... é que o desejo não cessa
mesmo quando não se quer mais nada
também é desejar.
Desejo mórbido desejo
estranho desejo,
que não cessa de desejar!
(Fatima Vieira - Florianópolis, outono/2011)
sábado, 17 de março de 2012
Ψ Retrospectiva: Carl Gustav Jung - Memórias, Sonhos e Reflexões
Ψ Não concordo quando dizem que sou um sábio ou um “iniciado” ...
- ... Nunca imaginei ser "aquele que cuida para que as cerejas tenham haste”, fico lá, de pé, admirando os recursos da natureza.
- Há uma bela lenda, de um rabino a quem um aluno, em visita, pergunta: “Rabbi, outrora havia homens que viam Deus face a face; por que não acontece mais isso?” O rabino respondeu: “Porque ninguém mais, hoje em dia, é capaz de inclinar-se suficientemente”.
É preciso, com efeito, curvar-se muito para beber no rio.
- A diferença entre a maioria dos homens e eu, reside no fato de que em mim as “paredes divisórias” são transparentes. Nos outros, elas são muitas vezes tão espessas, que lhes impedem a visão; eles pensam, por isso, que não há nada do outro lado.
- Sou capaz de perceber, até certo ponto, os processos que se desenvolvem no segundo plano; isso me dá segurança interior.
- Quem nada vê não tem segurança, não pode tirar conclusão alguma, ou não confia em suas conclusões.
- Ignoro o que determinou a minha faculdade de perceber o fluxo da vida.
- Talvez tenha sido o próprio inconsciente, talvez os meus sonhos precoces, que desde o início marcaram meu caminho.
- O conhecimento dos processos do segundo plano estabeleceu, muito cedo, minha relação com o mundo.
- Quando criança, sentia-me solitário e o sou ainda hoje, pois sei e devo dizer aos outros coisas que aparentemente não conhecem ou não querem conhecer.
- A solidão não significa a ausência de pessoas à nossa volta, mas sim o fato de não podermos comunicar-lhes as coisas que julgamos importantes, ou mostrar-lhes o valor de pensamentos que lhes parecem improváveis.
- Minha solidão começa com a experiência vivida em sonhos precoces e atinge seu ápice na época em que me confronto com o inconsciente.
- Quando alguém sabe mais do que os outros, torna-se solitário.
- Mas a solidão não significa, necessariamente, oposição à comunidade; ninguém sente mais profundamente a comunidade do que o solitário, e esta só floresce quando cada um se lembra de sua própria natureza, sem identificar-se com os outros.
- É importante que tenhamos um segredo e a intuição de algo incognoscível. Esse mistério dá à vida um tom impessoal e *"numinoso". ( *do latim "numen", divindade; adjetivo que qualifica algo que é sagrado ou divino).
- O inesperado e o inabitual fazem parte do mundo. Só então a vida é completa. Para mim, o mundo, desde o início, era infinitamente grande e inabarcável.
- Conheci todas as dificuldades possíveis para me afirmar, sustentando meus pensamentos.
- Havia em mim um daimon que, em última instância, era sempre o que decidia.
- Ele me dominava, me ultrapassava e quando tomava conta de mim, eu desprezava as atitudes convencionais.
- Jamais podia deter-me no que obtinha.
- Precisava continuar, na tentativa de atingir minha visão.
- Como, naturalmente, meus contemporâneos não a viam, só podiam constatar que eu prosseguia sem me deter.
- Ofendi muitas pessoas; assim que lhes percebia a incompreensão, elas me desinteressavam. Precisava continuar.
- À exceção dos meus doentes, não tinha paciência com os homens.
- Precisava seguir uma lei interior que me era imposta, sem liberdade de escolha.
- Naturalmente, nem sempre obedecia a ela.
- Como poderíamos viver sem cometermos incoerências?
- Em relação a alguns seres, era sempre próximo e presente, na medida em que mantínhamos um diálogo interior; mas podia ocorrer que, bruscamente, eu me afastasse, por sentir que nada mais havia que me ligasse a eles.
- Tinha que aceitar, penosamente, o fato de que continuassem lá, mesmo quando nada mais tinhama me dizer.
- Muitos despertaram em mim um sentimento de humanidade viva, mas só quando esta era visível no círculo mágico da psicologia; no instante seguinte, o projetor poderia afastar deles seus raios e nada mais restaria.
- Podia interessar-me intensamente por alguns seres, mas, desde que se tornavam translúcidos para mim, o encanto se quebrava. Fiz, assim, muitos inimigos.
- Mas, como toda personalidade criadora, não era livre, mas tomada e impelida pelo demônio interior.
- “Vergonhosamente, uma força arrebata-nos o coração. Pois todos os deuses exigem oferendas, E quando nos esquecemos de algum, Nada de bom acontecerá”, disse Hoelderlin.
- A falta de liberdade causava-me grande tristeza.
- Tinha às vezes a impressão de encontrar-me num campo de batalha: - Caíste por terra, meu amigo! Mas devo prosseguir, não posso, não posso parar! Pois “vergonhosamente uma força arrebata nosso coração.”
- Eu te amo, eu te amo, mas não posso ficar!
- No momento isso é dilacerante. Mas eu mesmo sou uma vítima, não posso ficar. Entretanto, o daimon urde as coisas de tal modo que é possível escapar à inconseqüência abençoada e, em oposição à flagrante “infidelidade”, permaneço totalmente fiel.
- Poderia talvez dizer: necessito das pessoas mais do que os outros, e, ao mesmo tempo, bem menos.
- Quando o *daimon (* em latim é dæmon = demônio), está em ação, sentimo-nos muito perto e muito longe. Só quando ele se cala é que podemos guardar uma medida intermediária.
- O demônio interior e o elemento criador se impuseram a mim de forma absoluta e brutal.
- As ações habituais que eu projetava passavam, geralmente, para o segundo plano, mas nem sempre ou em toda parte.
- Creio, entretanto, que sou conservador até a medula.
- Encho o cachimbo, usando o porta-tabaco de meu avô e guardo ainda seu bastão de alpinista ornado de casco de camelo, que ele trouxe de Pontresina, onde foi um dos primeiros veranistas.
- Sinto-me contente de que minha vida tenha sido aquilo que foi: rica e frutífera.
- Como poderia esperar mais? Ocorreram muitas coisas, impossíveis de serem canceladas. Algumas poderiam ter sido diferentes, se eu mesmo tivesse sido diferente.
- Assim, pois, as coisas foram o que tinham de ser; pois foram o que foram porque eu sou como sou.
- Muitas coisas, muitas circunstâncias foram provocadas intencionalmente, mas nem sempre representaram uma vantagem para mim.
- Em sua maioria dependeram do destino.
- Lamento muitas tolices, resultantes de minha teimosia, mas se não fossem elas não teria chegado à minha meta.
- Assim, pois, eu me sinto ao mesmo tempo satisfeitoe decepcionado. Decepcionado com os homens, e comigo mesmo.
- Em contacto com os homens vivi ocasiões maravilhosas e trabalhei mais do que eu mesmo esperava de mim. Desisto de chegar a um julgamento definitivo, pois o fenômeno vida e o fenômeno homem são demasiadamente grandes.
- À medida em que envelhecia, menos me compreendia e me reconhecia, e menos sabia sobre mim mesmo.
- Sinto-me espantado, decepcionado e satisfeito comigo.
- Sinto-me triste, acabrunhado, entusiasta.
- Sou tudo isso e não posso chegar a uma soma, a um resultado final.
- É para mim impossível constatar um valor ou um não-valor definitivos; não posso julgar a vida ou a mim mesmo.
- Não estou certo de nada. Não tenho mesmo, para dizer a verdade, nenhuma convicção definitiva – a respeito do que quer que seja.
- Sei apenas que nasci e que existo; experimento o sentimento de ser levado pelas coisas.
- Existo à base de algo que não conheço.
- Apesar de toda a incerteza, sinto a solidez do que existe e a continuidade do meu ser, tal como sou.
- O mundo no qual penetramos pelo nascimento é brutal, cruel e, ao mesmo tempo, de uma beleza divina.
- Achar que a vida tem ou não sentido é uma questão de temperamento. Se o não-sentido prevalecesse de maneira absoluta, o aspecto racional da vida desapareceria gradualmente, com a evolução. Não parece ser isto o que ocorre.
- Como em toda questão metafisica, as duas alternativas são provavelmente verdadeiras: a vida tem e não tem sentido, ou então possui e não possui significado.
- Espero ansiosamente que o sentido prevaleça e ganhe a batalha.
- Quando Lao-Tse diz: “Todos os seres são claros, só eu sou turvo”, exprime o que sinto em, minha idade avançada. Lao-Tse é o exemplo do homem de sabedoria superior que viu e fez a experiência do valor e do não-valor, e que no fim da vida deseja voltar a seu próprio ser, no sentido eterno e incognoscível.
- O arquétipo do homem idoso que contemplou suficientemente a vida é eternamente verdadeiro; em todos os níveis da inteligência, esse tipo aparece e é idêntico, quer se trate de um velho camponês ou de um grande filósofo como Lao-Tse.
- Assim, a idade avançada é... uma limitação, um estreitamento.
E no entanto, acrescentou em mim tantas coisas: as plantas, os animais, as nuvens, o dia e a noite e o eterno no homem.
- Quanto mais se acentuou a incerteza em relação a mim mesmo, mais aumentou meu sentimento de parentesco com as coisas.
- Sim, é como se essa estranheza que há tanto tempo me separava do mundo tivesse agora se interiorizado, revelando-me uma dimensão desconhecida e inesperada de mim mesmo.
(Fatima Vieira - Psicóloga Clínica)
- ... Nunca imaginei ser "aquele que cuida para que as cerejas tenham haste”, fico lá, de pé, admirando os recursos da natureza.
- Há uma bela lenda, de um rabino a quem um aluno, em visita, pergunta: “Rabbi, outrora havia homens que viam Deus face a face; por que não acontece mais isso?” O rabino respondeu: “Porque ninguém mais, hoje em dia, é capaz de inclinar-se suficientemente”.
É preciso, com efeito, curvar-se muito para beber no rio.
- A diferença entre a maioria dos homens e eu, reside no fato de que em mim as “paredes divisórias” são transparentes. Nos outros, elas são muitas vezes tão espessas, que lhes impedem a visão; eles pensam, por isso, que não há nada do outro lado.
- Sou capaz de perceber, até certo ponto, os processos que se desenvolvem no segundo plano; isso me dá segurança interior.
- Quem nada vê não tem segurança, não pode tirar conclusão alguma, ou não confia em suas conclusões.
- Ignoro o que determinou a minha faculdade de perceber o fluxo da vida.
- Talvez tenha sido o próprio inconsciente, talvez os meus sonhos precoces, que desde o início marcaram meu caminho.
- O conhecimento dos processos do segundo plano estabeleceu, muito cedo, minha relação com o mundo.
- Quando criança, sentia-me solitário e o sou ainda hoje, pois sei e devo dizer aos outros coisas que aparentemente não conhecem ou não querem conhecer.
- A solidão não significa a ausência de pessoas à nossa volta, mas sim o fato de não podermos comunicar-lhes as coisas que julgamos importantes, ou mostrar-lhes o valor de pensamentos que lhes parecem improváveis.
- Minha solidão começa com a experiência vivida em sonhos precoces e atinge seu ápice na época em que me confronto com o inconsciente.
- Quando alguém sabe mais do que os outros, torna-se solitário.
- Mas a solidão não significa, necessariamente, oposição à comunidade; ninguém sente mais profundamente a comunidade do que o solitário, e esta só floresce quando cada um se lembra de sua própria natureza, sem identificar-se com os outros.
- É importante que tenhamos um segredo e a intuição de algo incognoscível. Esse mistério dá à vida um tom impessoal e *"numinoso". ( *do latim "numen", divindade; adjetivo que qualifica algo que é sagrado ou divino).
- O inesperado e o inabitual fazem parte do mundo. Só então a vida é completa. Para mim, o mundo, desde o início, era infinitamente grande e inabarcável.
- Conheci todas as dificuldades possíveis para me afirmar, sustentando meus pensamentos.
- Havia em mim um daimon que, em última instância, era sempre o que decidia.
- Ele me dominava, me ultrapassava e quando tomava conta de mim, eu desprezava as atitudes convencionais.
- Jamais podia deter-me no que obtinha.
- Precisava continuar, na tentativa de atingir minha visão.
- Como, naturalmente, meus contemporâneos não a viam, só podiam constatar que eu prosseguia sem me deter.
- Ofendi muitas pessoas; assim que lhes percebia a incompreensão, elas me desinteressavam. Precisava continuar.
- À exceção dos meus doentes, não tinha paciência com os homens.
- Precisava seguir uma lei interior que me era imposta, sem liberdade de escolha.
- Naturalmente, nem sempre obedecia a ela.
- Como poderíamos viver sem cometermos incoerências?
- Em relação a alguns seres, era sempre próximo e presente, na medida em que mantínhamos um diálogo interior; mas podia ocorrer que, bruscamente, eu me afastasse, por sentir que nada mais havia que me ligasse a eles.
- Tinha que aceitar, penosamente, o fato de que continuassem lá, mesmo quando nada mais tinhama me dizer.
- Muitos despertaram em mim um sentimento de humanidade viva, mas só quando esta era visível no círculo mágico da psicologia; no instante seguinte, o projetor poderia afastar deles seus raios e nada mais restaria.
- Podia interessar-me intensamente por alguns seres, mas, desde que se tornavam translúcidos para mim, o encanto se quebrava. Fiz, assim, muitos inimigos.
- Mas, como toda personalidade criadora, não era livre, mas tomada e impelida pelo demônio interior.
- “Vergonhosamente, uma força arrebata-nos o coração. Pois todos os deuses exigem oferendas, E quando nos esquecemos de algum, Nada de bom acontecerá”, disse Hoelderlin.
- A falta de liberdade causava-me grande tristeza.
- Tinha às vezes a impressão de encontrar-me num campo de batalha: - Caíste por terra, meu amigo! Mas devo prosseguir, não posso, não posso parar! Pois “vergonhosamente uma força arrebata nosso coração.”
- Eu te amo, eu te amo, mas não posso ficar!
- No momento isso é dilacerante. Mas eu mesmo sou uma vítima, não posso ficar. Entretanto, o daimon urde as coisas de tal modo que é possível escapar à inconseqüência abençoada e, em oposição à flagrante “infidelidade”, permaneço totalmente fiel.
- Poderia talvez dizer: necessito das pessoas mais do que os outros, e, ao mesmo tempo, bem menos.
- Quando o *daimon (* em latim é dæmon = demônio), está em ação, sentimo-nos muito perto e muito longe. Só quando ele se cala é que podemos guardar uma medida intermediária.
- O demônio interior e o elemento criador se impuseram a mim de forma absoluta e brutal.
- As ações habituais que eu projetava passavam, geralmente, para o segundo plano, mas nem sempre ou em toda parte.
- Creio, entretanto, que sou conservador até a medula.
- Encho o cachimbo, usando o porta-tabaco de meu avô e guardo ainda seu bastão de alpinista ornado de casco de camelo, que ele trouxe de Pontresina, onde foi um dos primeiros veranistas.
- Sinto-me contente de que minha vida tenha sido aquilo que foi: rica e frutífera.
- Como poderia esperar mais? Ocorreram muitas coisas, impossíveis de serem canceladas. Algumas poderiam ter sido diferentes, se eu mesmo tivesse sido diferente.
- Assim, pois, as coisas foram o que tinham de ser; pois foram o que foram porque eu sou como sou.
- Muitas coisas, muitas circunstâncias foram provocadas intencionalmente, mas nem sempre representaram uma vantagem para mim.
- Em sua maioria dependeram do destino.
- Lamento muitas tolices, resultantes de minha teimosia, mas se não fossem elas não teria chegado à minha meta.
- Assim, pois, eu me sinto ao mesmo tempo satisfeitoe decepcionado. Decepcionado com os homens, e comigo mesmo.
- Em contacto com os homens vivi ocasiões maravilhosas e trabalhei mais do que eu mesmo esperava de mim. Desisto de chegar a um julgamento definitivo, pois o fenômeno vida e o fenômeno homem são demasiadamente grandes.
- À medida em que envelhecia, menos me compreendia e me reconhecia, e menos sabia sobre mim mesmo.
- Sinto-me espantado, decepcionado e satisfeito comigo.
- Sinto-me triste, acabrunhado, entusiasta.
- Sou tudo isso e não posso chegar a uma soma, a um resultado final.
- É para mim impossível constatar um valor ou um não-valor definitivos; não posso julgar a vida ou a mim mesmo.
- Não estou certo de nada. Não tenho mesmo, para dizer a verdade, nenhuma convicção definitiva – a respeito do que quer que seja.
- Sei apenas que nasci e que existo; experimento o sentimento de ser levado pelas coisas.
- Existo à base de algo que não conheço.
- Apesar de toda a incerteza, sinto a solidez do que existe e a continuidade do meu ser, tal como sou.
- O mundo no qual penetramos pelo nascimento é brutal, cruel e, ao mesmo tempo, de uma beleza divina.
- Achar que a vida tem ou não sentido é uma questão de temperamento. Se o não-sentido prevalecesse de maneira absoluta, o aspecto racional da vida desapareceria gradualmente, com a evolução. Não parece ser isto o que ocorre.
- Como em toda questão metafisica, as duas alternativas são provavelmente verdadeiras: a vida tem e não tem sentido, ou então possui e não possui significado.
- Espero ansiosamente que o sentido prevaleça e ganhe a batalha.
- Quando Lao-Tse diz: “Todos os seres são claros, só eu sou turvo”, exprime o que sinto em, minha idade avançada. Lao-Tse é o exemplo do homem de sabedoria superior que viu e fez a experiência do valor e do não-valor, e que no fim da vida deseja voltar a seu próprio ser, no sentido eterno e incognoscível.
- O arquétipo do homem idoso que contemplou suficientemente a vida é eternamente verdadeiro; em todos os níveis da inteligência, esse tipo aparece e é idêntico, quer se trate de um velho camponês ou de um grande filósofo como Lao-Tse.
- Assim, a idade avançada é... uma limitação, um estreitamento.
E no entanto, acrescentou em mim tantas coisas: as plantas, os animais, as nuvens, o dia e a noite e o eterno no homem.
- Quanto mais se acentuou a incerteza em relação a mim mesmo, mais aumentou meu sentimento de parentesco com as coisas.
- Sim, é como se essa estranheza que há tanto tempo me separava do mundo tivesse agora se interiorizado, revelando-me uma dimensão desconhecida e inesperada de mim mesmo.
(Fatima Vieira - Psicóloga Clínica)
domingo, 11 de março de 2012
sábado, 10 de março de 2012
... mulher és meio mulher, meio sonho.
Mulher Inspiradora Mulher, não és só obra de Deus;
os homens vão-te criando eternamente
com a formosura dos seus corações,
e os seus anseios
vestiram de glória a tua juventude.
Por ti o poeta vai tecendo
a sua imaginária tela de ouro:
o pintor dá às tuas formas,
dia após dia,
nova imortalidade.
Para te adornar, para te vestir,
para tornar-te mais preciosa,
o mar traz as suas pérolas,
a terra o seu ouro,
sua flor os jardins do verão.
Mulher, és meio mulher,
meio sonho.
(Rabindranath Tagore, in "O Coração da Primavera")
Fatima Vieira
Nós dois construiremos uma ponte para sempre, entre dois seres...
Num dia de primavera uma mullher chegou nos meus bosques solitários,
...
Veio para às minhas canções dar melodias,
Para aos meus sonhos dar doçura.
De súbito uma onda bravia
quebrou na praia do meu coração
E afogou toda a linguagem.
...
Parada sob a árvore, ela se voltou
Olhou fixo no meu rosto, que ficara triste com a dor; E, com passos rápidos veio e sentou-se junto a mim. Tomando minhas mãos entre as suas, disse: "Tu não me conheces, e nem eu a ti... me pergunto como pode ser isso?"
Eu disse: "Nós dois construiremos uma ponte para sempre,
Entre dois seres, cada qual para o outro desconhecido."
Esta incrível maravilha está no âmago das coisas".
(Rabindranath Tagore - 1861 / 1941 - Escritor/ Poeta/ Músico)
(Fatima Vieira)
... e lhes imponha silêncio com a tua formosura. (Tagore)
Como discutem e como gritam!
Como desconfiam e se desesperam!
Nunca param de brigar!
Que tua vida se ponha entre eles,
inalterável e pura como uma língua de luz
E lhes imponha silêncio com sua formosura.
Que cruéis os torna a cobiça e o ciúme!
Como violências disfarçadas sedentas de sangue são suas palavras.
Ponha-se entre seus corações irados e que
Teu olhar sublime caia sobre eles como cai a indulgente
Paz do anoitecer sobre a batalha do dia.
Deixe que olhem tua face
E que assim compreendam o sentido de todas as coisas.
Que te amem, e assim amem um ao outro.
Vem ocupar teu lugar nos braços do Eterno.
Abre e levanta teu coração ao nascer do sol, como uma nova flor.
E quando o sol se pôr, inclina tua cabeça e reze
Em silêncio a oração da tarde.
(Tagore)
(Fatima Vieira)
Como desconfiam e se desesperam!
Nunca param de brigar!
Que tua vida se ponha entre eles,
inalterável e pura como uma língua de luz
E lhes imponha silêncio com sua formosura.
Que cruéis os torna a cobiça e o ciúme!
Como violências disfarçadas sedentas de sangue são suas palavras.
Ponha-se entre seus corações irados e que
Teu olhar sublime caia sobre eles como cai a indulgente
Paz do anoitecer sobre a batalha do dia.
Deixe que olhem tua face
E que assim compreendam o sentido de todas as coisas.
Que te amem, e assim amem um ao outro.
Vem ocupar teu lugar nos braços do Eterno.
Abre e levanta teu coração ao nascer do sol, como uma nova flor.
E quando o sol se pôr, inclina tua cabeça e reze
Em silêncio a oração da tarde.
(Tagore)
(Fatima Vieira)
domingo, 4 de março de 2012
... e para mim, basta o essencial!
Contei meus anos e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente...
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.
Detesto fazer acareação de desafectos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário-geral do coral. 'As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa ...
... sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade.
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade.
O essencial faz a vida valer a pena.
E para mim, basta o essencial!
(Mário Pinto de Andrade/ 1928-1990)
Fatima Vieira
Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram, cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis, para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias que nem fazem parte da minha.
Detesto fazer acareação de desafectos que brigaram pelo majestoso cargo de secretário-geral do coral. 'As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos'.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência, minha alma tem pressa ...
... sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana, muito humana; que sabe rir de seus tropeços, não se encanta com triunfos, não se considera eleita antes da hora, não foge de sua mortalidade.
Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade.
O essencial faz a vida valer a pena.
E para mim, basta o essencial!
(Mário Pinto de Andrade/ 1928-1990)
Fatima Vieira
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