sábado, 22 de fevereiro de 2020

Ψ O ADOECER E O PROCESSO DE INDIVIDUAÇÃO

A doença causa um mal-estar ... e este mal-estar significa que não se está onde se deveria estar... a doença pode ser um pedido de cura do indivíduo, quer tirá-lo de onde ele está, quer libertá-lo, curá-lo.
*O processo de individuação, por ser arquetípico, ocorre do universal para o particular, acontece com a colaboração do Ego que, na maioria das vezes, traz mecanismos de defesa contrários a este processo.

*É o religar do Ego (centro da consciência) ao Self (Centro da Totalidade: Consciente e Inconsciente) e, nesta trajetória, o Ego precisa servir a algo maior, ao Self.

*Quando isto não acontece, significa que não estamos no caminho de nosso Chamado, então, como forma de reparar o amor próprio, de voltarmos ao nosso processo de individuação, podemos adoecer ou mesmo morrer.

*O cerne da Psicologia Junguiana é a individuação e este é o processo de criar e ampliar a consciência.

*A tomada de consciência vem acompanhada de imensa dor, uma vez que não é fácil ter consciência, porque isto implica em fazer escolhas, tomar decisões e assumir a responsabilidade pelas escolhas feitas.

*Escolher implica em abrir mão de alguma coisa em prol de outra, implica em dor e sofrimento.

*A proposta de Jung, de uma visão integral do ser humano, teve importante contribuição no campo da psicossomática.

*Tendo por base seus estudos empíricos, mais especificamente a associação de palavras utilizada em pacientes histéricos, foi-lhe possível observar que estes pacientes desenvolviam uma semelhante personalidade mórbida, demonstrando um querer ser/estar doente (JUNG, 2011), o que lhe permitiu concluir que os sintomas tinham origem nos complexos, levando as pessoas ao adoecimento, sendo, portanto, psique e corpo necessários de serem compreendidos em sua integridade.

*Neste contexto, tornou-se possível dizer que toda doença é psicossomática, formada por psique e soma, mente e corpo.

*Ramos (2006) observou que a expressões do fenômeno psique-corpo e suas alterações fisiológicas sincrônicas, se davam por meio de um complexo que se manifesta, ajudando a uma compreensão mais ampla da doença.

*O corpo é a visibilidade da alma, da psique, e a alma é a experiência psicológica do corpo.
          David Ohmer 
*Os sintomas físicos são retratos simbólicos do complexo patológico.
(JUNG, 2011).

*Todo sintoma ou fenômeno de crise que mobiliza um indivíduo, vem como possibilidade de tomada de consciência.

*O sintoma atua como uma proteção do Self, do Sagrado, para com o indivíduo.

*Como tentativa de se entender e se ressignificar a doença, há de se perguntar: "o que este sintoma está me impedindo de fazer e o que ele está me levando a fazer? ".

*É preciso entender qual o sentido deste sintoma, naquele determinado momento, na vida da pessoa.

*A doença causa um mal-estar no doente e este mal-estar significa que não se está onde se deveria estar.

*Novamente é preciso se fazer mais perguntas: "onde eu queria/deveria estar que não estou? ".

*Se não estamos bem onde estamos, se não estamos onde deveríamos/ gostaríamos de estar, sentimo-nos mal e temos mal-estar.

*Se trabalhamos, por exemplo, em um lugar onde não conseguimos mais engolir as coisas que nos dizem e nos fazem, temos vômitos, pois, para reverter o engolido é necessário vomitar o que não conseguimos engolir.

*O estômago é o lugar de recepção das coisas, por isso, comumente tão acometido quando não conseguimos digerir as coisas. Não vomitamos comidas, vomitamos palavras. Vomitamos símbolos. Precisamos refletir sobre o que nos intoxicou de verdade, o que está por nós sendo rejeitado.

*Muitas vezes a doença é um pedido de cura do indivíduo, quer tirá-lo de onde ele está, quer libertá-lo, curá-lo.

*Toda crise nos desperta para o Sagrado, nos chama para uma retomada de consciência, pois, cada escolha que fazemos, nos faz.

*Não podemos simplesmente servir aos outros, sermos apenas servos, temos que ser servos felizes ao que nos submetemos, do contrário, seremos infelizes e ineficientes e adoeceremos.

*Não diferente do que era na antiguidade, o corpo continua sendo o lugar do mal, só que não mais acoitado com chicotes e, sim, martirizado de outras formas, sendo, por exemplo, a doença advinda como consequência do pecado e merecimento, como forma de autopunição.

*A doença é muitas vezes uma penitência, como no mito do herói, onde a pessoa se vê como um herói decadente e se pune.

*A dor pode ser vista como um castigo, como um demônio, é a sombra atuando.

*Para Platão a dor era proveniente dos maus espíritos e dos Deuses.

*O corpo é um templo, um território Sagrado, com atributo psíquico e espiritual, e lança sintomas para que possa ser ouvido.

*A subjetividade e os aspectos psicológicos estão presentes em todas as doenças.

*A psique cria a partir da interpretação e são os complexos que interpretam, logo, para se encontrar a cura, é preciso ressignificar o complexo.

*Para que se tenha o sintoma, é necessário que haja um estilo dominante na consciência, que haja uma cisão.

*A cisão ocorre quando se começa a desagregar (ou é isto ou é aquilo, quero ou não quero) e o estilo que ganhar é o que vai para consciência, sendo assombrado pelo que ficou na inconsciente.

*O ideal é que estes estilos troquem de posição, estejam equiparados e não polarizados, podendo ora ser um e ora o outro a prevalecer, a escolher, sem necessariamente se ter uma rigidez, um determinado padrão a se seguir, pois, de outra forma, virará sintoma.

*É a intensidade que promove a cisão e faz o sintoma e, se isto acontece, para reestabelecer a saúde, o padrão dominante tem que descer aos infernos, recuperar o que aparentemente não tinha valor e subir de volta a consciência, sendo outro padrão agora, não mais o que estava na consciência e tão pouco o que estava na inconsciência, mas outro.

*Somos compostos por pares de opostos como luz e sombra, amor e poder, bem e mal e, quando ocorre a unilateralização de um dos polos, vem a doença como tentativa de reestabelecer a saúde.

*O literalismo é suicida, mata os outros sentidos. A literalidade implica em perda da capacidade simbólica, o que significa regressão da consciência. A literalidade gera a paranoia.

*O que determina o padrão de saúde, é o re-ligare, o estar ligado a Deus, ao Sagrado, ao Self.

*Saúde e doença podem ser vistas como imagens simbólicas, sendo a doença uma evidente disfunção no eixo Ego-Self.

*Compreender e tornar consciente estes símbolos, ajudará na ampliação da consciência e na integração dos conteúdos inconscientes, religando o Ego ao seu eixo com o Self, tendo sido a doença um caminho para restaurar a saúde, atuando diretamente no processo de individuação.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
JUNG, Carl Gustav. A Natureza da Psique. 10. ed. Petrópolis: Vozes, 2013.
_____________. A Prática da psicoterapia. 16 ed. Petrópolis: Vozes, 2013.
_____________. Arquétipos do Inconsciente Coletivo, 11 ed. Petrópolis: Vozes, 2014.
_____________. Estudos Experimentais. 2a. ed. Petrópolis: Vozes, 2011.
_____________. Psicologia do Inconsciente. 24 ed. Petrópolis, Vozes 2014.  RAMOS, Denise Gimenez. A Psique do Corpo: A Dimensão Simbólica da Doença. 3ª. Ed. São Paulo, Summus, 2006.

Texto: Andreia Araujo - Psicóloga Clínica, Analista Junguiana em Formação e Especialista em Psicologia Junguiana e Psicossomática pelo IJEP - Instituto Junguiano de Ensino e Pesquisa.

http://fatimavieira.psc.br/


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