domingo, 25 de maio de 2025

Jung e o Oráculo I Ching

I Ching: um procedimento alquímico 

Sobre Oráculo: A verdadeira resposta está no coração de cada um. Deus põe as cartas na mesa, o destino as corta. Quem faz as apostas é você. (Porém, você não pode manipular o mundo sempre ao seu gosto. O mundo é um vaso espiritual, o vaso de um deus. Não está somente sob seu controle e nunca estará).

"(...) mas a voz dos deuses é a mesma em todos os lugares. Em todos os países, mesmo longe de casa, encontram-se as mesmas regras universais. As regras humanas podem diferir fundamentalmente, mas a voz dos deuses é a mesma em todos os lugares. Quem ouve essas vozes pode falar todas as línguas da Terra, encontrará segurança e um lar onde quer que esteja. Deus, Alá, Manitou e Buda vêm todos da mesma fonte, apenas os nomes são diferentes. Então fale e comporte-se a partir dessa fonte, e aceite as regras humanas como sendo parte da paisagem local. Adapte-se a elas com cuidado extra, para compensar a falta de familiaridade com elas. Em cada situação desconhecida e nova, comporte-se como se estivesse em um país estranho."(citado no livro "Evangelii Gaudium", do Papa Francisco)

"O I Ching pode me mudar, se eu tiver paciência para meditar. É como um vinho de safra nobre." (Carl Jung, Conversas com CG Jung)

O Oráculo de Delfos (sec. IV a.C): tratava-se de um santuário grego onde uma sacerdotisa em estado de transe, comunicava o conselho de uma divindade, em resposta a perguntas de suplicantes que buscavam tal conselho profético quando decisões cruciais em suas vidas precisavam ser tomadas.

O principal conselho inscrito no local, era "Conhece-te a ti mesmo" ou "Conhece a tua alma". A psique compreendia forças de natureza espiritual que emanam da Alma e desafiam a noção de "realidade" apresentada pela vida externa e mundana do ego. 

A palavra grega "psique" (ψυχή) tem raízes no verbo "psychō", que significa "soprar" ou "respirar", tendo ligação com a respiração e o sopro vital. A Psicologia no sec. IX, foi descrita como a "ciência que trata a psique" agora usando o termo "psique" para significar a totalidade do ser humano.

Como Jung fez o paralelo entre a sua abordagem e o I Ching?
A Psicologia Analítica é uma abordagem da psicologia desenvolvida por Carl Jung que enfatiza a importância dos símbolos, mitos e arquétipos na compreensão da mente humana.
A psicologia analítica busca explorar o inconsciente coletivo e os processos de individuação. Sendo que o processo de individuação é o caminho para nos tornarmos indivíduos completos e integrados.
Jung criou o termo arquétipo para designar padrões universais de pensamento, comportamento e imagens simbólicas que são inerentes à natureza humana. Os arquétipos são considerados elementos fundamentais da psique humana e podem ser encontrados em mitos, contos de fadas e religiões.
filosofia chinesa possui um conjunto de tradições filosóficas que inclui o confucionismo, o taoísmo e o budismo, que enfatizam a harmonia com a natureza, o equilíbrio entre opostos e a busca da sabedoria através da contemplação e prática.
O I Ching, também conhecido como “O Livro das Mutações”, é um antigo oráculo chinês que remonta a mais de 3.000 anos atrás. 
Esse livro sagrado é composto por 64 hexagramas.

Jung acreditava que o uso do I Ching poderia nos auxiliar no processo de auto conhecimento, pois nos conecta com aspectos profundos de nossa psique e nos ajuda a compreender nossos desafios e potenciais.

O termo “sincronicidade” foi cunhado por Jung e se refere àquelas coincidências significativas nas quais circunstâncias externas refletem de maneiras surpreendentes o processo interno da pessoa envolvida, às vezes com implicações transformadoras de vida. Percebeu que no contexto do I Ching, a interpretação dos hexagramas e das respostas obtidas também ocorrem através da sincronicidade. O I Ching era visto por Jung como um símbolo poderoso que representava a sincronicidade, ou seja, a conexão entre eventos externos e estados internos da mente. Ele acreditava que o I Ching podia revelar padrões ocultos no universo.

O I Ching pode ajudar a trazer clareza, orientação e insights profundos para a nossa vida. Ele nos ajuda a compreender melhor os desafios que enfrentamos e a encontrar soluções criativas para os problemas do dia a dia, bem como uma ferramenta para acessar o inconsciente coletivo e obter insights da psique humana.
Jung usava o I Ching em suas sessões de terapia para ajudar seus pacientes a encontrar respostas profundas dentro de si mesmos.

Fonte:
Richard Wilhelm - "O Livro das Mutações"
Carl Jung sobre “I Ching” - Antologia

𝚿 Fatima Vieira - Psicóloga Clínica

quarta-feira, 7 de maio de 2025

Arquétipo Materno

Jung afirmou: “O inconsciente não é apenas mau por natureza, é também a fonte do bem supremo: não apenas escuro, mas também luminoso, não apenas bestial, semi-humano e demoníaco, mas sobre-humano, espiritual e, no sentido clássico da palavra, divino.”

Deusa Nut:                 imagem: artfex nepalegyptiangoddess
"Tente me alcançar, toque em mim. Estou sempre além do seu alcance. Não tente imaginar como Eu Sou porque você não pode. Sou o sempre presente e insondável desconhecido. Eu Sou a imensidão do céu estrelado. Estou além da compreensão humana na amplidão do meu ser. Sou um mistério até mesmo para mim Receba o meu abraço."
Nut a Deusa egípcia do céu noturno... aquela que depois da escuridão faz o sol nascer pela manhã, depois o devora outra vez à noite. Ela protege o morto durante sua jornada. Nut chega na sua vida para lembrar que você estará aberto ao mistério. Deixe espaço para Ela tecer sua vida. Ela o convida a abrir o coração e a confiar Nela, viver uma profunda unidade com o desconhecido. Chame-a e Ela virá imediatamente. Você se sentirá seguro, pleno, satisfeito, pronto para continuar sua jornada na vida.
                                                                          afrocentric inkArt blackVirginMary 
Há diferenças entre a Mãe Morte e a Mãe Sombra:
“Como posso ser substancial se não projeto uma sombra? Devo ter um lado sombrio também se quiser ser completo". (CG Jung)
Não podemos ter a mãe da luz sem a mãe das trevas. O arquétipo da mãe contém ambas. O arquétipo da Grande Mãe abrange tanto a Madona amorosa e protetora quanto a bruxa devoradora e aterrorizante. A Mãe Sombra nos sustente nos momentos sombrios de luto, iniciações, cura, inverno e dor. 
                                                                                   Peter Paul Rubens
Ela é a Sábia Anciã que oferece sua sabedoria duramente conquistada àqueles que ouvem seus sussurros. Ela mantém os portões da alma do coração abertos com um amor ferozmente gentil e terno, observando nossas incursões nas profundezas da alma com compaixão, gentileza e amor. Ela exerce sua compaixão com clareza para refletir a consciência que não serve e o segura enquanto você lamenta a dor e entra em uma nova luz. Ela é o útero escuro que nutre e ajuda você a se recompor. Ela é sempre terna enquanto nos aprofundamos para compreender a totalidade da nossa natureza. Por outro lado, a Mãe Morte pode se manifestar como a mãe terrível, devorando, engolfando ou sufocando seus filhos emocionalmente.
A mitologia cita as Keres: Elas seriam um dos maus espíritos liberados da caixa de Pandora. As Keres simbolizam os traumas emocionais, o destino cruel, fatal e impossível de escapar e elas seriam aquelas que traziam a morte violenta aos mortais. Górgona: uma mulher monstruosa que, com um único olhar, tinha a capacidade de transformar mortais em pedra. Harpias: A palavra harpia significa "ladrão", pois elas tinham a capacidade de roubar qualquer coisa, incluindo humanos, em um instante. Éris: A personificação da discórdia, do antagonismo, da corrupção e do conflito.
Diz Jung, “O complexo materno negativo pode incluir autoalienação, afeta negativamente a confiança, promove a idealização dos outros e corrói a energia vital. Alimenta um ciclo internalizado de auto-ódio, opressão e vingança.”
Allan Score em sua Teoria da Regulação Interpessoal fundamentada na neurociência, enfatiza como nosso senso de identidade e o desenvolvimento cerebral são formados por meio de nossos relacionamentos iniciais:
"Os traumas interpessoais precoces, como perda, rejeição, ausência e falta de apoio, podem levar a sentimentos de falha, inadequação de não ser bom o suficiente." 
Como um homem com o complexo da mãe devoradora vivência seu lado feminino internalizado? Geralmente, a mãe devoradora aparece nos homens como um elemento de fantasias românticas e sexuais irreais. Na puberdade, quando são muito ativos e criativos, eles de repente se tornam passivos e sonhadores. O desempenho deles na escola cai drasticamente. Eles ficam mergulhados até o pescoço em fantasias sexuais e devaneios. Nessa idade, é uma transição normal, mas se um homem se deixa levar por fantasias sexuais lascivas,
ele literalmente cai nas mãos do vampiro
ou, psicologicamente, da mãe devoradora. Ele perde a capacidade de tomar a própria vida em suas mãos. Ele perde a força de vontade e potência. Ele vive uma vida irreal. Se não resolvido este conflito, ele possivelmente se tornará um adulto infantilizado, buscando o objeto amado incansavelmente sem satisfação orgástica. 
Cure a ferida da Mãe: Se o relacionamento com sua mãe deixou cicatrizes, reserve um tempo para curá-las. Reconheça a dor e como ela impactou sua vida e encontre maneiras de se dar o amor que você precisaria dela. Considere fazer Psicoterapia.

Fonte: Amy Sophia Mirashinsky - "O Oráculo da Deusa" 
Clarissa Pinkola Estés - "Mulheres que Correm com os Lobos" 
CG Jung - “Os Complexos e o Inconsciente”
 𝚿 Fatima Vieira - Psicóloga Clínica

sábado, 3 de maio de 2025

A face real da mãe: a "boa mãe" é aquela da qual se pode separar... Lacan

“Qualquer amor já é um pouquinho de saúde,um descanso na loucura”. (Guimarães Rosa)

                                         imagem: Roberto Urbano
(...) mas, da mãe é preciso se ter a distância necessária, observar a expressão: 'não é bom ficar agarrado na barra da saia da mãe'. 
A “boa mãe” é aquela da qual se pode separar, aquela que acolhe o sujeito em sua subjetividade, e lhe permite decidir da significação de seu desejo, mas justamente porque não está toda ali. 
Lacan articulou em 1938 a face Real da mãe, estabelecendo uma ligação entre a mãe e a morte, a pulsão de morte.
Trata-se, diz Lacan, “não de uma associação mórbida, mas genérica”. Na medida em que essa separação não ocorre, "a imago materna salutar em sua origem mostra toda virulência, transformando-se em fator de morte".
                           imagem: projeto evilbook
Lacan refere que a representação materna é uma assimilação perfeita da totalidade do ser... "reconhecemos as nostalgias da humanidade: o abismo místico da fusão afetiva, a utopia social de uma tutela totalitária, todos saídos da obsessão com o paraíso perdido de antes do nascimento e da mais obscura aspiração à morte" ... “em seu abandono à morte, o sujeito procura reencontrar a imago da mãe”, mencionando que isso é o que vemos inclusive na prática do sepultamento cujo sentido é o de retorno ao seio materno.

Fonte: LACAN, Jacques (1938) - Os complexos familiares na formação do indivíduo. In: Outros Escritos.
 
                                                        𝚿 Fatima Vieira
                                                           http://www.fatimavieira.psc.br/